É possível ser feliz no trabalho? 

Um cheirinho de café recém coado, uma música, uma boa notícia. Para alguns, isso é muito, é um privilégio. Para tantos outros, basear a felicidade em algo tão simples e comum, é irrelevante. 

Há então aqueles que a vinculam a feitos grandiosos, conquistas, bens materiais. A verdade é que cada um terá seu propulsor de felicidade próprio, podendo ser considerado o ordinário ou o extraordinário.  

Mas se cada indivíduo pode ter um propulsor próprio, como as organizações conseguirão lidar com a temática?

Entender o conceito já é um bom começo. Felicidade é considerado multifacetado e complexo, à medida em que da mesma forma como é variável de pessoa para pessoa, a variação também ocorre a depender da ótica da área de estudo.

Na psicologia positiva, por exemplo, Martin Seligman relaciona felicidade a bem-estar subjetivo, que inclui a satisfação com a vida, emoções positivas e um sentido de propósito ou significado. Para o autor, a felicidade é alcançada no equilíbrio entre prazer, engajamento e significado na vida. 

Na filosofia, a definição varia de acordo com a abordagem filosófica: aristotélica, epicurista, estoica, existencial e outras. Para Aristóteles, por exemplo, a felicidade é o resultado de uma vida virtuosa, em que as ações são pautadas na justiça, coragem e temperança. É a felicidade em termos de Eudaimonia.
Em contraste, indo por uma lógica hedônica, Epicuro defende a felicidade como a busca pelo prazer e da evitação da dor. 

Cada definição oferece uma perspectiva única sobre o que pode contribuir para a felicidade. Assim, as organizações que desejam promover a felicidade no ambiente de trabalho, precisam estar atentas a essas diferentes perspectivas e trabalhar para criar um ambiente que não apenas valorize o desempenho, mas também o bem-estar e a realização pessoal de cada colaborador. 

A felicidade corporativa é ativo e diferencial competitivo 

Dessa forma, no contexto das organizações, a felicidade pode ser vista sob o prisma da cultura organizacional e do ambiente de trabalho. Para Shawn Achor, autor de The Happiness Advantage, a felicidade dos colaboradores é fundamental para o sucesso empresarial, uma vez ao se sentirem felizes, são mais motivados, engajados e resilientes (Achor, 2010). Ele defende que criar um ambiente onde as pessoas se sintam valorizadas, respeitadas e parte de uma comunidade é vital para o bem-estar delas.  

Um ambiente de trabalho que fomente o bem-estar emocional, oferece oportunidades de crescimento e reconhecimento, e promove um senso de propósito, pode aumentar significativamente a satisfação e a produtividade. Além disso, empresas que investem na felicidade dos seus colaboradores tendem a ter menores taxas de rotatividade, maior lealdade e um ambiente mais colaborativo. Somado a isso, impulsionam a inovação e o desempenho organizacional. 

Apesar do reconhecimento quanto a importância da promoção da felicidade, a realidade apresenta-se de forma diferente.  No Brasil, ver as pessoa como centro, ainda é exceção e o setor de Rh comumente é visto como área de apoio e não  estratégica, mesmo diante de dados tão alarmantes sobre saúde mental. 

As perdas empresariais com os transtornos psíquicos 

De acordo com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em 2022, 209.124 mil pessoas foram afastadas do trabalho por transtornos mentais, entre eles estão depressão, distúrbios emocionais e Alzheimer, enquanto em 2021 foram registrados 200.244 afastamentos. 

Segundo a pesquisa realizada durante o Congresso Nacional de Gestão de Pessoas (Conarh) em 2023, dos transtornos que acometem a saúde mental do trabalhador a ansiedade lidera como a doença que mais afasta os colaboradores do trabalho (51%). Em seguida vêm depressão (17%), estresse (16%) e síndrome de Burnout (14%). 

As causas relacionadas aos problemas de saúde mental no trabalho são: competitividade excessiva, demandas de trabalho exageradas e irrealistas, falta de organização e flexibilidade, assédio moral e longas jornadas de trabalho. 

Mas se de um lado há dados tão alarmantes e, de outro, o conhecimento do que se pode fazer para promover a felicidade, consequentemente os resultados financeiros almejados pelas empresas, por que ainda é incomum o investimento em ações efetivas de bem-estar? 

Por ser ainda uma temática pouco desenvolvida, a falta de conhecimento sobre como medir e demonstrar o retorno pode ser um dificultador da implementação de ações. Outro fato pode ser o foco em resultados financeiros imediatos, contrapondo os benefícios do investimento em bem-estar que são relacionados a longo prazo.

A felicidade é fator de sustentabilidade 

Além disso, a cultura organizacional em muitas empresas pode não priorizar o bem-estar dos funcionários, vendo-o como uma preocupação secundária em comparação com as metas de desempenho e produtividade. Ou ainda pode haver resistência à mudança. Implementar programas de bem-estar, em alguns casos, exige uma mudança significativa na maneira como a empresa opera, o que pode encontrar resistência tanto da liderança quanto dos funcionários uma vez que implica não somente em mudança de mentalidade, como também cultural de fato. 

Porém começar pode ser mais simples do que parece. Implementar práticas de respeito, ética, clareza nas comunicações e criar um ambiente de segurança psicológica são passos fundamentais. Programas de reconhecimento, oportunidades de desenvolvimento e apoio à saúde mental são estratégias eficazes para fomentar um ambiente de trabalho mais feliz e produtivo.  

Se a felicidade dos seus colaboradores ainda não é uma prioridade na cultura da sua organização, talvez os índices como absenteísmo e rotatividade sejam. Ironicamente, a felicidade tem impacto comprovado sobre eles, sabia? Que tal colocar esse tema na pauta da próxima reunião?

Texto produzido exclusivamente para o blog Lonax. Sâmara Borges é doutora em Estratégia, Marketing e Inovação e ministra aulas há 12 anos em cursos de graduação e pós-graduação além de palestrar sobre os temas: Felicidade Organizacional, Cultura Empresarial, Bem-Estar e Propósito no Trabalho. Fontes deste artigo: 

Seligman, M. (2011). “Flourish: A Visionary New Understanding of Happiness and Well-being”. New York: Free Press. 

Achor, S. (2010). “The Happiness Advantage: How a Positive Brain Fuels Success in Work and Life”. New York: Crown Business. 

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