Sensemaking – Capítulo I

O mesmo tempo que existia na Idade Média existe agora. As mesmas 24 horas que a Natura e a Apple tem, sua empresa tem. Então o que faz com que o tempo de algumas empresas (e algumas pessoas) pareça render mais? Resposta recorrente: uma boa gestão do tempo.

Trabalho há 20 anos com organizações de setores muito variados, de multinacionais a startups, cooperativas e ONGs, governo e academia, e posso afirmar que cursos de “gestão do tempo” estão na top list dos RHs. Basta você “dar um Google” em “gestão do tempo” para encontrar listas para se tornar um exímio “gestor do tempo”: comece cedo, não procrastine, agende as tarefas, defina deadlines, priorize, delegue as tarefas, foque, aprenda a dizer não e… evite o stress.

Não há nada de errado em seguir estes conselhos, mas o fato é que você pode ter feito tudo isso e sua entrega não fazer a menor diferença. Sim, no fim das contas, a única coisa que realmente importa: que valor sua entrega gerou para o negócio? Não importa se você e sua equipe entregaram algo em tempo recorde (e sem stress). Importam 3 coisas:

  1. Resolver o problema certo
  2. Resolver, certo, o problema
  3. Entregar valor continuamente

Para cada uma destas premissas, podemos derivar uma pergunta:

Ironicamente, responder a estas três perguntas “consome” tempo. Refletir consome tempo, mas reduz os riscos de entregas sem valor. E entregas sem valor minam a autoestima das pessoas. Afinal, corremos tanto para que?

Este é justamente o cenário que tenho encontrado e que justifica as estatísticas que dizem que apenas 13% dos funcionários estão engajados em seus trabalhos. Não é irônico? Sabemos que em breve, provavelmente, mais cedo do que gostaríamos, todo trabalho repetitivo será executado por máquinas. E, mesmo assim, quase 90% dos humanos entrevistados está trabalhando no modo automático. Está apenas “batendo ponto.” Liderança e liderados.

Sem tempo (e disposição) para pensar, não existe nem inovação, porque a mente tensa entrega respostas conhecidas.

Parece que quanto mais corremos contra o tempo, mais o tempo nos escapa, porque empresas que não inovam têm vida curta. E assim, confunde-se “pressa” com “agilidade”, “responsividade” com “evolução” e “reatividade” com “reflexão”.

Sensemaking: porque sem sentido não há propósito

Tudo isso faz pensar que a grande escassez nas organizações não é o tempo, mas o sentido. Não é por acaso que, de repente, ter um “propósito” tornou-se imperativo nos negócios. O propósito de uma empresa serve para orientar os esforços conjuntos dos colaboradores, gerar motivação e senso de pertencimento. Mas ter um propósito não basta.

Como podemos mudar isso? Precisamos questionar o real sentido por trás de cada uma destas atividades. Parar de sermos coletores/produtores de informação para nos tornarmos habilitadores de inteligência.

Independentemente do que está escrito no seu crachá, no seu diploma ou no seu perfil no Linkedin, você é um vendedor.

Compartilho aqui a primeira parte de um processo de Problem Solving que desenvolvi em 20 anos de consultoria e docência –  chama-se Fillingaps®  e tem apenas 3 etapas. Criei este método porque cansei de presenciar excelentes respostas não gerarem resultado por falta de entendimentos prévios.

MÉTODO FILLINGAPS®

Etapa 1: SENSEBREAKING – Quebre conexões inúteis

Etapa 2: SENSEMAKING – Crie conexões úteis

Etapa 3: SENSEGIVING – Traduza a nova proposta

O que este método tem de novo? As três etapas são orientadas pela criação de sentido.

Note que o método é sustentado por duas premissas: Não adiante encontrar a resposta para o problema se:

  1. O problema não incomoda as partes supostamente interessadas (stakeholders)
  2. A resposta do problema não fizer sentido para os steakholders

Antes de reunir um grupo para gerar ideias de solução, é preciso ter certeza de que o problema existe e é compreendido da mesma forma por diferentes atores. Normalmente clientes são ótimos para definir os sintomas gerados pelo problema e são bons em descrever como seria a realidade se o problema não existisse. Estas respostas não ajudam muito a solucionar o problema, mas dão informações preciosas sobre como estas pessoas pensam e como suas redes mentais estão construídas. Descontruir estas redes é o foco do sensebreaking.

Como é o processo de Sensebreaking

Aprender é criar conexões novas. Fazemos isso associando recursos da imaginação e da memória. A neurociência explica o papel da emoção na fixação de memórias de longo prazo. Se um evento provoca uma emoção mais forte, o cérebro cria uma espécie de marcação para o ocorrido visando poupar energia de processamento da próxima vez que o evento ocorrer. Assim, da segunda vez, a reflexão é substituída pela reação. Este processo é importante para nossa sobrevivência, porém os atalhos não consideram as consequências a longo prazo. Em resumo, agir por impulso pode nos prejudicar no futuro.

À medida que relegamos as atividades repetitivas às máquinas, passamos a precisar cada vez mais que a empresa se comporte como um organismo inteligente – um ser que aprende. Quantas vezes você já ouviu que precisa “aprender a desaprender”?

Desaprender é desconectar coisas. Sem este processo, o novo não tem condições de acontecer.

Se uma empresa necessita resolver um problema é porque existe uma percepção de que algo poderia ser diferente. A busca pela resposta nova é legítima. Porém, sem um processo de desconstrução de percepções, conceitos e crenças qualquer proposta nova enfrentará muitos obstáculos para acontecer. Posso afirmar, por observação, que a inovação não acontece com mais frequência por falta de criatividade, mas por excesso de vaidade e apego ao passado.

Uma sessão de Sensebreaking desafia as partes interessadas a questionarem o nível de compreensão do problema e possíveis relações equivocadas de causa-efeito. É comum o grupo ter uma ideia de solução prematura e sem fundamento lógico. Algumas perguntas que catalisam o processo reflexivo:

Por que tal coisa é um problema?  É um problema novo ou recorrente? Se o problema não existisse, como seria? O que esperamos que aconteça após a solução do problema? A solução pode gerar novos problemas?  Quais são nossas incertezas acerca do problema?  Quais são as restrições para a geração das ideias? O que é valor para cada stakeholder? Que premissas devem guiar a ideação? Quais serão as evidências de sucesso?

A entrega do Sensebreaking é uma descrição detalhada e, o mais importante, um alinhamento de expectativas para a etapa seguinte – a criação de respostas.

 

Retirado e adaptado para o blog Lonax sob autorização da autoraDenise Eler; consultora, palestrante e professora da Fundação Dom Cabral e PUC Minas além de referência em Sensemaking e Design no país.

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