Inteligência de Mercado e Transformação Digital – Parte 1

Objetivos de Aprendizagem: após a leitura deste artigo em 3 partes o leitor deverá ser capaz de:

  1. Entender o conceito e as derivações da Inteligência de Mercado e da Transformação Digital;
  2. Entender a digitalização dos negócios e as respectivas dimensões utilizadas na coleta de inteligência de mercado, explorando estratégias online;
  3. Compreender a inteligência de mercado e sua relação direta com a transformação digital a partir de temáticas derivadas envolvendo a experiência de empresas no Brasil;
  4. Refletir como a mudança no ambiente de negócios tem sido apoiada pela verdadeira revolução no uso dos dados e a gestão estratégica da informação;
  5. Conhecer temáticas inerentes e derivadas desse universo de coinovação, de open innovation e de Growth Hacking.

Informação: o insumo mais valioso

A informação é considerada a verdadeira matéria prima da competitividade e inovação das empresas e tem revolucionado a forma de se fazer negócios no mercado, criar, cocriar, colaborar e estabelecer um relacionamento com clientes, além de entender os movimentos da concorrência. A inteligência de mercado envolve entender necessidades, planejar, extrair, transformar e carregar dados e informação, construindo uma maior capacidade de decisão nas empresas.

Nesse sentido, a inteligência ganha força com a digitalização. Isso é percebido a partir da velocidade em que se extrai, processa e distribui informações de valor. Tudo isso foi incrementado por machine learning, envolvendo os algoritmos de inteligência artificial. No entanto, será discutido que essa definição é incremento fundamental da inteligência de mercado, mas que nem tudo se resume a isso.

Já a transformação digital é marcada pelas empresas que trouxeram uma dinâmica diferente ao mercado, com processos e fluxos de informação nunca vividos. A transformação digital potencializou o volume de dados e informações que circulam no mercado. Esse território de big data é a atmosfera dos negócios, sejam eles grandes bancos e instituições financeiras, construtoras, indústrias de automóveis, laboratórios farmacêuticos, planos privados de saúde ou startups. Para justificar a presença dessas temáticas por aqui, basta observar a presença da informação em tudo que se decide dentro de uma empresa.

O real conceito de inteligência de mercado

Quando se fala de Inteligência de Mercado, alguns equívocos conceituais ainda podem ser observados no conteúdo disseminado na internet. Algumas fontes simplificam o conceito do que é realmente a inteligência gerada nas empresas. Para começar já seguindo o primeiro objetivo específico do capítulo, vale entender o que é a inteligência de mercado para que se possa caminhar para uma implementação segura ou aumentar a eficácia na exploração da inteligência na empresa.

Comecemos então pelo entendimento da inteligência de mercado e depois partiremos para a transformação digital e suas derivações. O que mais importa é que tais temáticas têm provocado resultados surpreendentes no ambiente de negócios e nos negócios ao redor do mundo.

A Inteligência de Mercado não envolve apenas utilizar um software de business intelligence.  A inteligência de mercado é uma expressão já bastante difundida e que ganhou notoriedade e até popularidade no Brasil, sobretudo na última década. No entanto, a inteligência de mercado ou a inteligência competitiva não são expressões contemporâneas e já vêm dos tempos mais remotos da guerra. A inteligência de mercado encontra sua base na inteligência competitiva que é a definição-chave no campo da Administração (Estratégia e Marketing e Inovação, ao se abordar a vigilância tecnológica).

Empresas inteligentes

A literatura demonstra que a inteligência possui seu desenvolvimento científico mais robusto na Ciência da Informação. No campo mercadológico, o conhecimento de inteligência baseado em melhores práticas de mercado e compartilhamento de experiências encontra sua base na Strategic & Competitive  Intelligence Professionals (SCIP), comunidade global sem fins lucrativos que reúne profissionais da área de Inteligência e Estratégia. A inteligência direcionada ao mercado é uma das ferramentas de maior relevância para apoiar e direcionar a estratégia das empresas, sobretudo quando se busca um posicionamento estratégico, antecipação de movimentos da concorrência e inovação. Isso é verificado pelo fato de a inteligência utilizar a informação de forma ágil, ética, categorizada ou estruturada. Esse esforço vem permitindo ampliar vantagens competitivas surpreendentes em negócios de diferentes portes, desde uma startup, passando por empresas baseadas em plataformas (UBER, Cabify, Spotify, Netflix) até a grandes corporações globais (Honda, Scania, 3M, entre outras).

Todos os processos de inteligência de mercado ou inteligência competitiva devem ser orientados por um ciclo lógico de cinco etapas complementares e cíclicas, sendo os quatro primeiros estágios distintos, aqueles que culminam na tomada de decisão e replanejamento do ciclo.

Os estágios até a tomada da decisão inteligente

Ao primeiro estágio pode-se atribuir o nome de planejamento da inteligência que constantemente é definido pela estratégia da empresa e toma por base as necessidades de informação estratégica. Tudo começa com o primeiro estágio do planejamento que só é possível após uma lúcida e embasada análise da identidade, ideologia empresarial, passando por uma análise macro ambiental e setorial.

Na fase de planejamento são definidas quais são as necessidades reais de informações estratégicas(VIDIGAL, 2016). Nesse momento, devem ser definidos os Key Performance Indicators (KPIs) da Inteligência, definidos por Francis e Herring (1999) como Key Intelligence Topics (KITs), vistos como os tópicos direcionadores do trabalho da inteligência, ou seja, os pontos de partida que orientarão os estágios posteriores do ciclo. Para que os KITs façam sentido e consigam exercer o papel de verdadeiros drivers na construção de conhecimento para apoiar a inteligência, é necessário fazer as perguntas certas para encontrar informações de valor e sanar as necessidades de informação estratégica.

Nesse sentido, construir as Key Intelligence Questions (KIQs) é tarefa fundamental para orientar a fase da coleta de dados e de informações, que podem e devem ser coletadas a partir das mais variadas fontes de informação.

O segundo estágio

Após o planejamento, segue-se para o segundo estágio, de coleta ou captura de informações. Como fontes de informação para a coleta, estão desde os registros internos do negócio (dados gerados por sua força de vendas e demais setores internos à sua empresa como marketing, finanças, pessoas e supply chain), o cliente, o fornecedor, o governo, o concorrente e as fontes secundárias de informações como sites de governos e de notícias. Todas essas fontes são utilizadas para dar input ao ciclo de inteligência.

O terceiro passo

O terceiro estágio é a análise e o processamento (amplamente apoiado pela estatística, softwares de pesquisa qualiquantitativa, softwares de business intelligence ofertados por marcas como Tableau, Qlik, Microsoft, IBM, Oracle, entre outras listado pelo “quadrante mágico da empresa Gartner”.

Com a popularização dos softwares, a facilidade de acesso a essas ferramentas, que em sua maioria já oferecem um serviço na web sem a necessidade de robustos servidores e dependência direta da área de Tecnologia da Informação da empresa, surgiu um falso entendimento de que a atividade de inteligência se resume aos softwares. No estágio de análise e processamento, são confrontadas, cruzadas e validadas as informações que chegaram do estágio da coleta. Nesse momento, após os cruzamentos típicos do processamento (facilitado por produtos de tecnologia da informação baseado em algoritmos de máquina), são gerados insights e alertas em telas facilmente interpretáveis, painéis, dashboards e relatórios.

Tais resultados são vistos como os primeiros produtos de inteligência que ainda poderão passar por uma análise estratégica para posteriormente serem disseminados aos interessados ou clientes da inteligência.

Quarto estágio: disseminação

A disseminação dos produtos de inteligência é o quarto estágio no qual a comunicação do produto de inteligência é realizada de forma estratégica e direcionada. Nessa etapa permite-se disseminar o conhecimento como valor agregado às áreas do negócio. A disseminação é realizada por meio de reuniões, apresentações nas mais diversas formas e cresce a estratégia de contar histórias por meio dos dados, conhecida como a técnica de Storytelling.

Do quinto estágio saem as decisões estratégicas

O que é chamado de quinto estágio nada mais é do que o momento da tomada de decisão baseada nos produtos da inteligência. Esses produtos permitem que o estrategista decida tomando por base os alertas. Entre eles estão informações oriundas de cenários de investimento ou desinvestimento, oportunidades para investir em inovação, produção de novas linhas de produtos ou serviços, além de contribuir para a precificação e criação de novos argumentos de venda e pós-venda. A inteligência de mercado deve ser encarada como uma atividade sistemática dentro das empresas e não necessariamente deve ser considerada como uma área ou setor específico. Ou seja, não espere uma placa na porta de uma sala que identifique a área, embora exista.

A inteligência de mercado pode ser exercida pelas áreas de Marketing, Estratégia, Planejamento Estratégico ou Comercial e Vendas. Evidências de pesquisas anteriores demonstram que essa última área tem as características mais próximas e correspondem à base do que se tem praticado. A prática da atividade de inteligência de mercado, sobretudo no Brasil, também ocorre em áreas como Customer Success, Customer Insights, entre outras nomenclaturas. No entanto, o ponto de partida para a atividade encontra lugar em três dimensões prioritárias: “mercado, concorrência e clientes” (em alguns casos dando lugar a outra quarta dimensão como “fornecedores”).

Uma empresa inteligente é vista como aquela que faz uso estratégico da informação e de forma contínua. Isso propicia a ela inovar mais e ser mais ágil do que as demais, pois o conceito de ágil não está na velocidade e sim em fazer de forma correta na primeira vez, reduzindo erros, fazendo de forma mais original e, na maioria das vezes, antecipando a ação dos demais players do mercado.

Os números da empresa como a performance da sua força de vendas, o tamanho do mercado em que se atua, a difusão e ideal divisão geográfica do mercado, as oportunidades de inovação, a performance de produtos e a força de vendas orientam a inteligência.

 

Texto adaptado para o blog Lonax sob autorização do autor. Frederico Vidigal é Professor associado na Fundação Dom Cabral nas disciplinas de Estratégia, Inteligência Competitiva e Inteligência de Mercado. Professor titular I do IBMEC em Estratégia empresarial. Sócio-diretor da CEGEX Consulting. Pós-doutorado em Estratégia, Marketing e Inovação pelo CEPEAD / FACE/UFMG em cotutela com o ISEG – Lisbon School of Economics and Management. Doutor em Ciência da Informação pela UFMG.

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